Baseado no artigo “The Leverage Arbitrage: Why Everything Feels Broken” de Tushar Dadlani (Link original)
Vivemos um momento paradoxal: nunca tivemos acesso a tanta tecnologia e informação, mas ao mesmo tempo, parece que perdemos o controle sobre nosso entorno. No mundo jurídico brasileiro, essa sensação é ainda mais intensa com a adoção crescente de inteligência artificial - 26% de aumento entre 2022 e 2024 no Judiciário - enquanto nossas instituições jurídicas ainda lutam para se adaptar a essas mudanças.
Parece que estamos perdendo o controle e o posicionamento das pessoas ao nosso redor. Os dispositivos estão se tornando novos deuses, e nós perdemos o contato com nossos pares, com as pessoas próximas a nós. Tudo que vivemos está baseado na quantidade de seguidores que temos, na nossa reputação online. No direito, isso se traduz em advogados mais preocupados com suas métricas no LinkedIn do que com a qualidade do atendimento aos clientes.
Algo fundamental mudou na forma como o poder funciona, e a maioria de nossas instituições não percebeu. Estamos vivendo o que pode ser chamado de “divergência de arbitragem de alavancagem” - uma lacuna crescente entre a velocidade com que alguns atores podem mudar o mundo e a velocidade com que outros podem responder a essas mudanças.
Pense nisso: uma pequena equipe desenvolvendo IA jurídica pode alterar a forma como contratos são analisados em questão de meses, com sistemas alcançando até 90% de precisão na previsão de resultados judiciais. Enquanto isso, instituições educacionais de direito levam anos apenas para atualizar seus currículos, e os órgãos reguladores precisam de décadas para desenvolver respostas coerentes às mudanças tecnológicas.
A estrutura começa com uma observação simples feita pelo empreendedor Naval Ravikant: existem três tipos de alavancagem, cada uma operando em velocidades matemáticas diferentes:
1. Alavancagem de Trabalho (Linear): Escala através da coordenação humana - comitês da OAB, votações, gestão tradicional de escritórios. É como a advocacia sempre funcionou.
2. Alavancagem de Capital (Exponencial): Escala através do uso de recursos - investimentos em legal techs, criação de novos mercados, engenharia financeira. O mercado global de tecnologia jurídica deve alcançar US$ 69,7 bilhões até 2032.
3. Alavancagem de Código (Sistemática): Escala através de automação sistemática - algoritmos, plataformas, efeitos de rede. É o que vemos com chatbots jurídicos, análise preditiva e sistemas de machine learning que analisam grandes volumes de dados em segundos.
Segundo pesquisas recentes, 77% dos advogados acreditam que a IA substituirá parcialmente tarefas jurídicas básicas, e 53% apontam que o papel do advogado será complementado pela IA. Isso não é apenas uma mudança técnica - é uma transformação fundamental na natureza da profissão.
Ferramentas que Já Mudaram o Jogo:
Enquanto 67% das lideranças de grandes empresas no Brasil planejam aumentar investimentos em IA até 2025, nossas instituições jurídicas ainda operam com processos do século passado. A OAB ainda discute regulamentações básicas para o uso de IA, enquanto startups já implementam sistemas complexos de automação jurídica.
Esta arbitragem de alavancagem cria um ciclo vicioso. À medida que a lacuna entre diferentes tipos de alavancagem se amplia, os mecanismos tradicionais de coordenação se tornam cada vez mais ineficazes. Isso leva mais atores em direção a abordagens de alavancagem superior, acelerando a divergência.
No Direito, Isso Se Manifesta Como:
Em vez de tentar desacelerar a mudança tecnológica ou tornar as instituições mais rápidas, precisamos de “alfabetização em alavancagem” - ajudar as pessoas a reconhecer o tipo de poder que estão realmente exercendo e usá-lo de forma mais consciente.
1. Reconheça Seu Tipo de Alavancagem
2. Desenvolva Competências Híbridas
3. Redesenhe Métricas de Sucesso
Com temas como inteligência artificial, proteção de dados e propriedade intelectual continuando centrais nas discussões de 2025, precisamos construir organizações projetadas para operar em múltiplos níveis de alavancagem simultaneamente.
Tendências Confirmadas para 2025 e além:
As apostas não poderiam ser maiores. Se não desenvolvermos abordagens conscientes para gerenciar a arbitragem de alavancagem, corremos o risco de um futuro onde a capacidade tecnológica avança exponencialmente enquanto a capacidade de coordenação social deteriora linearmente - uma receita para o colapso civilizacional.
Mas se pudermos construir alfabetização em alavancagem em como projetamos instituições, criamos filhos e estruturamos carreiras, podemos criar mecanismos de coordenação sofisticados o suficiente para aproveitar o poder tecnológico exponencial para resultados genuinamente benéficos.
A escolha não é entre tecnologia e tradição - é entre coordenação consciente entre níveis de alavancagem e otimização inconsciente dentro de silos de alavancagem. O primeiro poderia criar um florescimento humano sem precedentes. O último já está criando uma disfunção institucional sem precedentes.
A pergunta é: qual futuro escolheremos construir no direito brasileiro?
Bruno Pellizzetti, CEO da ProcStudio e ProcStudio IA, é um advogado previdenciário com mais de 15 anos de experiência no mundo jurídico e nos últimos anos tem se especializado em tecnologia e inteligência artificial. É responsável pela implantação de soluções tecnológicas em processos jurídicos nas empresas com o objetivo de democratizar o acesso ao conhecimento jurídico para todos e aumentar a eficiência e precisão das equipes jurídicas.
Artigo baseado em “The Leverage Arbitrage: Why Everything Feels Broken” por Tushar Dadlani. Link original